CONSIDERAÇÕES CARTOGRÁFICAS EM GEOPROCESSAMENTO
- A PROBLEMÁTICA ATUAL -
PAULO MÁRCIO LEAL DE MENEZES 1
CARLA BERNADETE MADUREIRA CRUZ 2
LETÍCIA MARIA MAYR 3
RAFAEL SILVA DE BARROS 4
1
Eng. Cartógrafo, Prof. Assistente do Dep. Geografia / IG2
Eng. Cartógrafa, Doutoranda do Dep. Geografia / IG3
Bióloga, Prof. Assistente do Dep. Biologia Marinha / IB4
Bolsista CNPq, Graduando do Dep. Geografia / IGUNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
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Resumo. A necessidade de manipulação de grandes quantidades de dados priorizou o uso das mais novas técnicas de informática, para o perfeito acompanhamento das modificações espaço-temporais que ocorrem na superfície terrestre. O uso intensificado do conjunto de ferramentas de Geoprocessamento, vem obrigando usuários a definerem suas próprias bases de dados cartográficas, já que não se tem disponível uma base oficial digitalizada, que sirva de apoio às pesquisas e mesmo produção, de uma forma geral. Este trabalho aborda as dificuldades de caráter técnico-operacional envolvidos na geração de bases cartográficas, contextuando num primeiro plano a realidade brasileira.
Abstract. The management of great amounts of geographical data, qualified the use of modern computer techniques to monitorate the space-temporal chnges of Earth surface. The intense use of Geographical Information Systems has forced users to define their own cartographic database, once there is no available official digital bases to support researches and production. In this paper is dicussed operational and technical problems involved in the making of these cartographic digital bases. Its also commented the Brazilian cartographica reality at a specific area.
1. INTRODUÇÃO
Inegavelmente, geoprocessamento e sistemas de informações geográficas são temas que envolvem um número cada vez maior de usuários, técnicas e aplicativos. A abertura de campos de aplicabilidades cada vez mais diversa é crescente e marcante nos dias atuais, podendo-se mesmo afirmar, que o único requisito necessário ao uso das técnicas de geoprocessamento numa área específica, é a possibilidade dos fenômenos que a qualificam, serem georreferenciados. Assim, a quantidade de áreas de atuação do geoprocessamento é praticamente ilimitada, permitindo-se o tratamento, isolado e conjunto, de diferentes fenômenos de natureza física, social, biológica, econômica, de saúde, e etc., posicionados num determinado espaço geográfico.
As modernas técnicas computacionais, que permitem a captura, o tratamento e a análise de fenômenos espaciais, ditos georreferenciados, facilitam a consideração de uma enorme base de dados. Estes tipos de dados devidamente organizados, permitem efetivar diversas tarefas temáticas e ajudam a responder questionamentos, tais como: onde está? quais as suas características? como se relacionam? o que contém ?
A consideração de um grande volume de dados de natureza tão complexa em aplicações ambientais, prioriza a utilização de sistemas gerenciadores especiais, que funcionam como integradores e sintetizadores da informação geográfica. Tais sistemas estão invadindo o mercado atual, cuja necessidade de conhecimento da realidade espacial, através de seus fenômenos, há muito se faz presente.
Aliando-se a uma verdadeira popularização de softwares que permitem a manipulação de dados e informações geográficas, constata-se a descoberta de uma perigosa conclusão por parte de um sem número de especialistas, que na busca de estudos temáticos específicos, com representações gráficas espaciais, geram suas próprias bases de dados de apoio baseados em soluções cartográficas muitas vezes inviáveis e comprometedoras.
2. PROBLEMAS CARTOGRÁFICOS
Uma representação cartográfica genérica possui dois problemas básicos inerentes ao seu processo de geração: a escala de representação e a projeção cartográfica.
A escala é inerente a toda e qualquer representação onde aplica-se um processo de redução das informações, visto a impossibilidade de apresentá-las em tamanho natural. Já a projeção, está relacionada à representação de uma área onde uma forma esférica ou esferóidica tenha que ser considerada, com as consequentes associações das distorções para a sua representação plana.
Evidentemente que estes dois problemas levam consequentemente a outros, tais como, a generalização, a simplificação, a classificação e a simbolização dos fenômenos a serem representados. O desconhecimento desses problemas, aliados à facilidade de manipulação dos softwares atuais, torna-se um fator crítico pois encoraja os diferentes tipos de usuários à gerarem documentos cartográficos em suas pesquisas e trabalhos, sem o necessário conhecimento técnico a nível de suporte que o geoprocessamento necessita para ser confiável em termos de documentação cartográfica.
As limitações impostas pela cartografia, necessárias à geração de bases cartográficas precisas e acuradas, além de serem por vezes desconhecidas, uma vez que não é uma regra a presença de cartógrafos em equipes de usuários de geoprocessamento, no lugar de serem acatadas são tidas como figuras de retórica pelos especialistas temáticos, criando-se assim uma confusa afirmativa, de que o excesso de zelo nos cuidados com a precisão é na maioria das vezes desnecessário. O que acontece é que, de fato, a natureza do dado a ser trabalhado pode exigir maiores cuidados na sua representação espacial, embora não se deva aqui confundir os dados de origem temática com os da base cartográfica de apoio. Já que esta última, sendo responsável pela localização, ajuste e ligação dos diferentes trabalhos efetuados sobre uma determinada região, exige levantamentos e formas de representação mais apuradas.
Por outro lado, a inexistência de uma base digital única, gerada por órgãos normativos governamentais, ou pelo menos a existência de alguma base, seja vetorial ou matricial, reconhecida e disponível, faz, automaticamente, com que cada organização, seja de produção, pesquisa ou aplicação final, venha a gerar a sua própria base digital. Pode-se afirmar neste momento, que fica instituído um caos em termos de informações. Esta situação, mesmo que as bases analógicas utilizadas tenham sido as mesmas (o que nem sempre ocorre), fará com que as bases digitais sejam diferentes por problemas de ordem operacional, tais como: precisão instrumental, diferenças de operadores, escala de aquisição, transformação de projeções, metodologias específicas, e etc, para não citar problemas de transformação de datum geodésico.
Dificilmente duas bases digitalizadas, mesmo em uma mesma organização, mas por diferentes operadores, serão 100% compatíveis devido a estes problemas. Isto não ocorre em países mais desenvolvidos, por já existirem bases digitais em diversas escalas, disponíveis ao público usuário, seja ele qual for. Este problema é típico no Brasil, sendo constatado em todas as áreas que estão implantando algum tipo de geoprocessamento.
A necessidade de geração de bases cartográficas adequadas, que ofereçam suporte aos diversos projetos de pesquisa desenvolvidos no Brasil, consome substancial perda de tempo. Agravando ainda mais o quadro, estas bases são mantidas como iniciativas isoladas que dificilmente serão aproveitadas por outras instituições, por todos os motivos já citados, e até por falta de conhecimento de sua existência.
Por outro lado, há de se ressaltar que sempre gerar-se-ão bases com erro superior aos documentos tomados por apoio à sua origem. Qualquer processo de digitalização é mais um erro acrescido na cadeia de propagação, sendo evidente que o erro de posicionamento só tenderá a ser maior do que o erro do documento original, não existindo qualquer processo possível que venha a diminui-lo, nem tampouco mante-lo..
3. REALIDADE
O trabalho cartográfico fundamental de um país, encontra-se no seu mapeamento terrestre, que tem no levantamento geodésico e na fotogrametria aérea, uma ferramenta para a obtenção e determinação das minúncias a serem representadas na carta. O planejamento e a implantação de projetos que visam satisfazer as exigências relativas ao meio ambiente, não podem ser executados sem a informação prestada por documentos cartográficos adequados, isto é, precisos e atualizados.
A situação brasileira, em termos de recobrimento cartográfico, é muito séria e tem comprometido várias atividades que necessitam do conhecimento do espaço geográfico com relativa atualidade e continuidade. É certo que as dimensões continentais de nosso país agravam os problemas de ordem econômica, dificultando a produção adequada do mapeamento sistemático, isto para não falar nas escalas cadastrais, de responsabilidade dos órgãos municipais. O Quadro I mostra a distribuição programada e "de fato" executada, das folhas topográficas, em diferentes escalas, do território nacional.
Quadro I : Mapeamento do Território Nacional
Escala |
No. total de folhas |
No. de folhas executadas |
% mapeada |
1 :1.000.000 |
46 |
46 |
100 |
1 : 500.000 |
154 |
68 |
44 |
1 : 250.000 |
556 |
529 |
95,1 |
1 : 100.000 |
3049 |
2087 |
68,4 |
1 : 50.000 |
11928 |
1641 |
13,7 |
1 : 25.000 |
47712 |
548 |
1,2 |
É evidente que um território com as dimensões do Brasil, necessita de atualização diversificada, tanto em escala temporal como em escala geográfica. Porém, mesmo em regiões de grande atividades, notadamente pertencentes ao Sudeste e Sul, e ainda em algumas áreas de expressão do Centro-oeste e Nordeste, não são encontrados investimentos recentes. Uma rápida análise do entorno da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, área de excelência a nível de importância político-administrativo-ambiental, permite ter-se uma amostra desta situação (ver Figura I). Figura I : Cartas 1:50.000 do entorno da Baía de Guanabara (Nome, ano de cobertura aerofotogramétrica e datum geodésico) São observadas variações em termos do ano do levantamento (apesar de algumas terem sido reeditadas em 1989 e 1991, não foram feitas atualizações) e de datum geodésico entre as folhas. Esta deficiência se faz sentir quando a área de estudo abrange um número de folhas muito grande, o que é mais fácil de ocorrer nas escalas maiores, obrigando o usuário a "compatibilizar" tais diferenças com um mínimo de prejuízo ao trabalho. Infelizmente, na maioria das vezes, variações de projeções ou data geodésicos não são sequer notadas, o que permite a execução de avaliações espaciais, tais como, cálculos de coordenadas, área, distância e volume, totalmente comprometidas. Deve-se mais uma vez ressaltar, que apesar de um trabalho possuir um cunho essencialmente temático, as variáveis em estudo precisam ser localizadas e distribuídas sobre uma base cartográfica, sendo esta responsável pelas quantificações que porventura serão efetuadas. Com isso, esta preocupação com a confecção atual das bases de apoio, está atrelada ao fato de muitas avaliações temáticas, realizadas em centros de pesquisas sérios, não retratarem a realidade ambiental observada. Em relação a base cartográfica cadastral, onde são consideradas as escalas maiores que 1:10.000, quando existentes (caso dos municípios de maior importância), também são encontradas as mesmas deficiências. Voltando ao exemplo do município do Rio de Janeiro, esta situação foi modificada muito recentemente, quando efetuou-se um recobrimento aerofotogramétrico em 1991, gerando cartas nas escalas 1:10.000 e 1:2.000, em substituição ao levantamento anterior de 1975. Quanto a cartografia náutica, a sua situação relativa é melhor que a topográfica, uma vez que por imposição de normas internacionais as atualizações são obrigatoriamente mais frequentes. Esta situação apresenta um quadro de aquisição de dados cartográficos para a confecção de uma base digital bastante inadequada, que, quando conjugada ao desconhecimento de conceitos básicos de cartografia podem vir a gerar e estão gerando documentação de qualidade cartográfica a desejar. 4. CONCLUSÕES O conhecimento dos recursos subjacentes à tecnologia de geoprocessamento e o notável crescimento das aplicações na Europa e América do Norte, consubstanciam a convicção de que a solução de questões ambientais passa, mais cedo ou mais tarde, inevitavelmente, pela implantação e utilização de um sistema de informações geográficas. No Brasil é marcante a inexistência de bases cartográficas adequadas, principalmente no que tange às escalas de maior detalhamento. Isto significa, que unidades de zoneamento pequenas, a nível municipal por exemplo, não oferecem as informações necessárias a sua perfeita caracterização ambiental. Agravando ainda mais o quadro, a tecnologia ainda largamente utilizada, baseia-se na adoção de métodos analógicos que demandam mais tempo de execução, tornando ineficiente o acompanhamento do processo evolutivo ambiental, que pode ser extremamente dinâmico. Prioriza-se desta forma, uma maior discussão em termos da necessidade de geração de uma base cartográfica digitalizada única, que atenda as diferentes necessidades taxonômicas; tanto a nível técnico como operacional. É importante que tal responsabilidade recaia sobre organizações oficiais, preparadas para este tipo de trabalho, que possam vir a garantir a confiabilidade necessária aos documentos gerados, disponibilizando tais, dados de modo a cessar a multiplicação de iniciativas isoladas, garantindo desta forma uma compatibilização efetiva para as bases de dados. 5. BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA ANUÁRIO DA DIRETORIA DE SERVIÇO GEOGRÁFICO, Brasília 1995. ROBINSON, A.H.- Elements of Cartography- 6aEd -John Wiley & Sons, 1995 CLARKE, K - Computer and Analytical Cartography - Prentice Hall,1995 CROMLEY,A - Digital Cartography - Prentice Hall, 1993 BONHAM-CARTER,G.F. - Geographic Information Systems for Geoscientists, Pergamon Press, 1994